As eleições brasileiras são apenas mais uma oportunidade perdida?

Se você considerar os investidores pelo valor de face, as eleições brasileiras no domingo foram um negócio promissor. Depois de uma campanha leve sobre política e um pesado assassinato de caráter, nenhum dos principais candidatos à presidência foi vitorioso no primeiro turno, trazendo a eleição de volta em quatro semanas.

O dinheiro na Faria Lima em São Paulo ficou tão satisfeito com o poder do presidente Jair Bolsonaro, que triunfou solidamente na região mais próspera do Brasil, ficando inesperadamente em segundo lugar para o rival do PT Luis Inácio Lula da Silva, que muitos esperavam. Evite o escoamento cruzando o limite de 50%.

O índice iBovespa no mercado de São Paulo saltou 5% na segunda-feira, enquanto o real brasileiro recuperou a maior parte de suas perdas na semana passada, quando as pesquisas começaram a falar sobre a vitória de Lula no primeiro turno. As ações da Petrobras, empresa estatal de energia que Bolsonaro quer privatizar e Lula quer ser divulgado como herói nacional, saltaram quase 15%.

Investidores esperam que o fracasso de Lula em vencer no primeiro turno vá, no mínimo, moderar os sonhos de “grande governo” do político de esquerda e forçá-lo à direita para atrair eleitores independentes. Ele pode até cumprir sua promessa não tão forte de um superávit orçamentário básico.

Mas o pacote de esperanças e sonhos que revivem as origens brasileiras tem pouco a oferecer ao povo brasileiro.

A economia brasileira ainda está presa no passado. Após o que ficou conhecido como a “década perdida”, quando lutou para manter a solvência da dívida externa, o Brasil emergiu em 1990 com um PIB per capita equivalente a 24,5% das nações industrializadas combinadas da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico. No ano passado, 30 anos após esses tempos difíceis, o PIB per capita do país ainda era de apenas 22,7% da média da OCDE.

Esse declínio está no centro do fracasso fundamental do Brasil: sua incapacidade de alcançar um crescimento econômico sustentável e equitativo. Infelizmente para a maioria dos brasileiros, nem Lula nem Bolsonaro parecem ter uma ideia de como deixar o futuro do Brasil mais alinhado com o “progresso” impresso em sua bandeira.

Bolsonaro, que recebeu mais de 51 milhões de votos no domingo, ainda pode vencer o segundo turno em 30 de outubro. É difícil dizer se ele tem um programa econômico, apesar da inconsistência entre sua promessa de cortar impostos, sua promessa fiscal ortodoxa e sua adoção de transferências de dinheiro para famílias em dificuldades, uma tentativa nua de comprar eleitores com dinheiro dos contribuintes.

Sua aparente estratégia econômica liberal é inconsistente com sua postura nacionalista “antiglobalização”. Ele contratou um garoto de Chicago, Paulo Geddes, como seu ministro da Economia para buscar uma versão extrema da economia de livre mercado, mas depois ignorou regularmente seus conselhos. O único compromisso econômico estrito de Bolsonaro é permitir que o agronegócio faça sua vontade, na Amazônia e além.

Lula, cuja vitória no segundo turno ainda era prevista pelos críticos, tem um histórico ainda mais forte. Mas ele também não tem muitos planos para resolver as brechas no Brasil.

Aos 76 anos, o principal objetivo de Lola era a salvação. Ele não quer que o presidente seja lembrado por ter sido preso por propina no maior escândalo de corrupção já registrado no Brasil, mas como um representante de uma das épocas mais prósperas da história moderna do país – de 2003 a 2010, quando a economia cresceu, talvez porque pela primeira vez Os frutos do crescimento foram amplamente compartilhados.

Infelizmente, um guia de jogo que funcionou nos anos 2000, financiado pelo apetite aparentemente insaciável da China por produtos brasileiros, não funcionará no implacável ambiente macroeconômico de hoje. A redistribuição será mais difícil com a China parando de comprar muitas coisas brasileiras e o Federal Reserve aumentando agressivamente as taxas de juros, desenhando uma semelhança assustadora com o episódio anterior de aperto monetário dos EUA há 40 anos que ajudou a desencadear a década perdida no Brasil.

Enfrentar o desafio de longa data e persistente do Brasil – em três palavras: crescimento sem brilho e injusto – exige mais ambição. Quer Lula decida ter um superávit primário ou não, seu kit de ferramentas não está atualizado.

Mesmo antes da pandemia, três em cada dez famílias brasileiras viviam com menos de US$ 4,50 por dia, segundo um estudo do Banco Mundial. Um em cada doze vivia com menos de US$ 1,10. De acordo com a Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina e o Caribe, o Brasil continua tendo uma das mais graves desigualdades da região – e, de fato, uma das maiores desigualdades do mundo.

A redistribuição por si só não pode curar essas feridas. O Brasil precisa de um forte crescimento para pagar por isso. Quem sabe de onde isso virá? O país cresceu menos de 0,4% ao ano na última década – mal o suficiente para financiar qualquer tipo de boom. Em termos reais, o PIB per capita foi menor no ano passado do que em 2010.

Sua eterna ambição de desenvolver uma base industrial moderna fracassou. Mais da metade das exportações brasileiras são matérias-primas, principalmente produtos agrícolas e minerais, e estão sujeitas a flutuações na demanda global. O valor agregado na manufatura é de 10% do PIB, comparado a 23% em 1990.

Até a esperança é difícil de encontrar. O crescimento da produtividade é muito baixo e os meios para melhorá-lo são escassos. Apenas 23% dos brasileiros com idade entre 25 e 34 anos estavam matriculados na universidade, menos da metade da proporção nos países da OCDE.

É certo que superar esses obstáculos é difícil. Mesmo o presidente Fernando Henrique Cardoso, indiscutivelmente o agente econômico mais bem-sucedido do último meio século no Brasil, que domou a hiperinflação e colocou o país em um caminho de alguma aparência de desenvolvimento, não conseguiu enfrentar o desafio.

Mas, por um lado, o desafio é direto: trata-se de confrontar grupos poderosos e entrincheirados que se beneficiam do status quo e impedem mudanças significativas.

Por exemplo, o governo brasileiro tem recursos. A receita tributária do governo geral é de aproximadamente 40% do PIB, de acordo com o Fundo Monetário Internacional, colocando-a no mesmo nível de muitas das social-democracias ricas da Europa. Mas muito dinheiro é desperdiçado em uma das folhas de pagamento públicas mais infladas do mundo.

Mas talvez o maior obstáculo seja a classe empresarial, que por muito tempo contou com alguma forma de patrocínio estatal. Com mercados protegidos, subsídios e outros privilégios, a economia do estado brasileiro enriquece a elite empresarial mimada, mas atende mal a maioria dos brasileiros.

Quando os brasileiros voltarem às urnas no final de outubro, seria bom se suas escolhas incluíssem alguém disposto a reconhecer esse fato e finalmente começar a mudá-lo.

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Esta coluna não reflete necessariamente a opinião da equipe editorial ou da Bloomberg LP e seus proprietários.

Eduardo Porter é colunista da Bloomberg Opinion cobrindo América Latina, política econômica dos EUA e imigração. Ele é o autor de American Poison: How Racial Enmity Destroyed Our Promise and The Price of Everything: Finding a Way in the Madness of What Things Cost.

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