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A eleição de Joe Biden como novo presidente dos Estados Unidos deixa a relação do Brasil com a maior potência mundial “em uma posição delicada”, nas palavras do ex-embaixador dos Estados Unidos em Brasília, Thomas Shannon.
Em entrevista à BBC News Brasil, ele disse que foi “um erro” do presidente Jair Bolsonaro basear a relação bilateral com os Estados Unidos em sua proximidade pessoal com o presidente em exercício, Donald Trump, que foi derrotado pelo democrata.
Biden garantiu neste sábado (07/11) a vitória na Pensilvânia, superando os 270 delegados necessários para serem eleitos pelo Colégio Eleitoral. Nos Estados Unidos, a eleição do presidente é indireta e é por delegados que os candidatos conquistam a maioria dos votos que recebem em cada estado.
“O presidente Bolsonaro tem um parceiro estratégico importante (os Estados Unidos da América) que ocupa uma posição política ruim. É triste, porque as relações entre o Brasil e os Estados Unidos são muito importantes para que o Brasil se encontre nesta posição”, disse Shannon.
Durante a campanha, Biden expressou preocupação com a conservação da floresta amazônica e até considerou represálias econômicas contra o Brasil se o desmatamento não parasse. Segundo o ex-embaixador, a questão ambiental “será muito importante desde o início do governo Joe Biden”, mas os problemas podem ser evitados “com a diplomacia”.
Historicamente, o Brasil e os Estados Unidos desenvolveram um diálogo ambiental positivo, e acho que isso é possível (hoje), mas muito vai depender do Brasil e da forma como eles querem (sob o governo Bolsonaro) apresentar a questão ambiental, e a forma como ele enfatizou mostra um desejo e capacidade de cooperar global e multilateralmente no campo do meio ambiente. “
Shannon é considerada uma das maiores autoridades americanas na América Latina: além de ser embaixador em Brasília de 2010 a 2013, foi diplomata na Guatemala e na Venezuela e encerrou a carreira em 2018 como subsecretário de Estado para Assuntos Políticos dos Estados Unidos.
Ele atualmente trabalha como consultor sênior de política externa no Arnold and Porter International Arbitration Office em Washington. Um dos clientes da empresa é o presidente venezuelano Juan Guaidó, motivo pelo qual Shannon se recusou a comentar a relação entre os Estados Unidos e a Venezuela no governo Biden.
crédito, Departamento de Estado dos E.U.A
Tom Shannon, retratado em 2017, como subsecretário de Estado; Ele também foi embaixador no Brasil e considerado um dos maiores especialistas americanos na América Latina
Confira a entrevista por telefone na sexta-feira, quando a contagem dos votos indicava uma grande probabilidade de Biden vencer.
BBC News Brasil – Quais seriam as grandes mudanças na política externa dos Estados Unidos se Joe Biden for confirmado como o novo presidente dos Estados Unidos?
Thomas Shannon – O candidato Joe Biden tem muita experiência em questões globais, já que esteve no Senado (teve vários mandatos como Senador) e também como Vice-Presidente (Barack Obama). Ele conhece bem o mundo e conhece muito bem a política (externa) americana baseada em alianças e parcerias para promover a segurança e os interesses dos Estados Unidos, mas também em valores e princípios. Portanto, acredito que se pode esperar um fortalecimento do sistema de alianças e parcerias.
Em segundo lugar, tentará proteger os interesses dos EUA não unilateralmente, mas dentro do sistema multilateral. Ele falará sobre os valores e princípios dos Estados Unidos: democracia, direitos humanos, direitos ambientais e civis, a importância do meio ambiente. Também tentará unir as democracias para responder ao desafio colocado pelos governos autoritários.
Acho que essas serão as questões prioritárias para o governo Biden.
BBC News Brasil – O presidente Jair Bolsonaro expressou publicamente seu apoio à reeleição de Donald Trump e criticou Joe Biden. Isso cria dificuldades para o relacionamento com o potencial governo Biden ou há espaço para um bom relacionamento entre Brasil e Estados Unidos apesar desse comportamento do presidente brasileiro?
Shannon – Eu entendo que o presidente Bolsonaro desenvolveu uma relação pessoal com o presidente Trump e que essa relação pessoal definiu a relação bilateral. Mas a verdade é que as relações entre países do porte do Brasil e dos Estados Unidos não podem se limitar às relações pessoais entre lideranças. Isto é um erro.
O presidente Bolsonaro tem um importante parceiro estratégico (os Estados Unidos da América), pois ocupa uma posição política ruim. É triste porque as relações entre o Brasil e os Estados Unidos são tão importantes para o Brasil se encontrar nesta posição agora.
A questão é que o presidente Biden entende a importância do Brasil, ele conhece bem. Ele é um dos poucos presidentes que chegará à Casa Branca percebendo a importância do Brasil. Acho que estamos em uma posição crítica que depende da diplomacia.
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Tom Shannon acredita que o presidente Bolsonaro “ foi um erro ” basear o relacionamento bilateral na proximidade pessoal com Trump
BBC News Brasil – Para sair dessa situação delicada, será importante para alguns movimentos no Brasil, como o presidente Bolsonaro, parar de criticar Joe Biden ou mudar o chanceler Ernesto Araujo?
Shannon – O Brasil vai decidir quem vai representar o país. Estamos em uma posição importante para que ambos os países reflitam cuidadosamente sobre seus interesses essenciais. Em seguida, eles tentaram construir um diálogo focado nesses interesses. Com esses interesses bem definidos, acredito que estaremos em uma posição onde o relacionamento pode ser fortalecido.
BBC News Brasil – Em seu primeiro debate eleitoral com o presidente Trump, Joe Biden propôs a criação de um fundo internacional de US $ 20 bilhões para preservar a Amazônia e disse que o Brasil poderia sofrer retaliação econômica se o desmatamento não parar. Se Biden fosse confirmado como presidente, você acha que o governo dele seria duro na questão ambiental e poderia realmente se vingar do país?
Shannon – A preocupação ambiental é importante tanto para o vice-presidente Biden quanto para o Partido Democrata.
No Brasil, a região amazônica é um importante símbolo no combate às mudanças climáticas. Historicamente, o Brasil e os Estados Unidos desenvolveram um diálogo ambiental positivo e importante e acho que isso é possível (hoje), mas muito dependerá do Brasil e da maneira como eles (o governo de Bolsonaro) desejam apresentar a questão ambiental e a maneira como demonstram o desejo e a capacidade de cooperar global e multilateralmente no campo do meio ambiente.
BBC News Brasil – Se o Brasil não demonstrar essa capacidade, você acha que pode chegar a um nível elevado de retaliação comercial?
Shannon – Espero que não chegue a esse ponto, porque somos importantes parceiros econômicos e o objetivo da diplomacia é evitá-lo.
Portanto, é melhor agir para evitar chegar ao ponto onde ocorre esse tipo de confronto.
BBC News Brasil – O presidente Bolsonaro reclama quando líderes de outros países falam sobre a Amazônia, que ele considera uma falta de respeito à soberania do Brasil. Essas demandas de políticos americanos e europeus em relação à Amazônia são legítimas?
Shannon – Para mim, as taxas são fáceis de evitar. Ou seja, com um pouco de diplomacia brasileira, isso poderia ser evitado. Portanto, a melhor recomendação é dialogar e construir os métodos necessários para a cooperação e cooperação. Isso evita esse tipo de mal-entendido.
BBC News Brasil – Alguns analistas de política externa brasileiros acreditam que o principal objetivo do governo Joe Biden no Brasil será persuadir o governo Bolsonaro a proibir a empresa chinesa Huawei de participar da implementação da tecnologia 5G no país, enquanto a administração Trump continua os esforços nesse sentido. Área. Você acha que isso seria mais importante do que a questão ambiental?
Shannon – O tema China será importante e também o tema 5G, porque é a infraestrutura de TI. Essa questão não vai desaparecer das relações bilaterais (com a mudança do presidente nos Estados Unidos).
Mas, novamente, a diplomacia pode apresentar a questão de uma maneira mais fácil para encontrar uma solução e evitar problemas. Mas, sim, seria importante.
BBC News Brasil – E que tipo de mudança pode acontecer na diplomacia neste tema?
Shannon – Não sei por que não estou trabalhando nisso, mas a preocupação é claramente a proteção das informações que passam por essa infraestrutura digital.
Assim, pode-se encontrar uma forma de proteger a informação, e talvez essa seja uma forma de evitar problemas.
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Em debate contra Trump, o candidato democrata Joe Biden criticou a política ambiental do Brasil
BBC News Brasil – Se o Brasil concordar em banir a Huawei do 5G, analistas brasileiros acreditam que o governo de Joe Biden poderia ser mais flexível em outras áreas, como a esfera ambiental. você concorda?
Shannon – Eu entendo o propósito da pergunta, mas a questão ambiental será muito importante desde o início, desde o início do governo Joe Biden.
BBC News Brasil – Você mencionou que Joe Biden, se vencer a eleição, será um dos presidentes dos Estados Unidos mais familiarizados com o Brasil. O que isso pode significar para a relação entre os dois países? Como Biden deveria olhar para o Brasil?
Shannon – Como eu disse antes, ele tentará reconstruir as alianças e parcerias que historicamente definem a política externa dos Estados Unidos. E a América Latina é uma região importante para nós: econômica, comercial, política, mas também em termos de segurança.
Acho que ele buscará uma relação positiva e fecunda com a região. Ele percebe que durante esta pandemia, com seu impacto e suas consequências econômicas, a região precisa de ajuda e solidariedade. Acho que ele vai começar a usar isso para criar espaço para um amplo diálogo sobre a região.
É importante lembrar que em abril haverá a Cúpula das Américas. Será um dos primeiros eventos diplomáticos multilaterais dos quais o presidente participará e estará nos Estados Unidos. Vamos ver se a reunião será pessoal (se a epidemia de coronavírus acabar), espero.
BBC News Brasil – Como você avalia a relação de dois anos entre o Brasil e os Estados Unidos e os presidentes Bolsonaro e Trump? O Brasil se beneficiou dessa proximidade ou não?
Shannon – Acho que graças ao trabalho do Departamento de Estado (dos EUA) e do Itamaraty, o Brasil e os Estados Unidos chegaram a alguns acordos e conquistas importantes nas relações bilaterais. Aproveite um bom relacionamento pessoal e use-o para realizações valiosas. Isso foi positivo.
BBC News Brasil – O presidente Donald Trump tem assumido uma postura muito agressiva contra os imigrantes latinos, mas obteve um resultado eleitoral melhor do que em 2016 entre este grupo na Flórida. O que explica isso?
Shannon – É importante lembrar que a comunidade latina aqui nos Estados Unidos é muito diversificada.
Há uma grande diferença entre hispano-americanos em Los Angeles (Califórnia, o estado que mais vota no Partido Democrata) e cubano-americanos na Flórida, ou venezuelano-americanos, colombiano-americanos. Ou centro-americanos (imigrantes da América Central) que vivem aqui perto de Washington. Eles têm origens diferentes nos Estados Unidos, experiências diferentes e também vêm de situações diferentes.
Na Flórida, muitas famílias latinas são exiladas ou refugiadas que fugiram de governos autoritários e dos abusos dos direitos humanos. Portanto, eles têm uma visão muito diferente de uma família de três ou quatro gerações (na verdade nascida nos Estados Unidos) que mora em Los Angeles e tem suas raízes no México, mas tem uma vida mais estabelecida nos Estados Unidos. É um erro tentar entender os latino-americanos nos Estados Unidos como um grupo de pessoas.
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