BNDES financia empresas de embalamento de carne que se abastecem de fazendas desmatadas e usam mão de obra escrava

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) financia frigoríficos que abatem animais criados em fazendas desmatadas ilegalmente, proibidas pelo Ibama e sobrepostas a unidades de conservação ou terras indígenas, e que utilizam trabalho escravo em suas atividades. Isso foi revelado por uma reportagem exclusiva da Repórter Brasil que analisou empréstimos no valor de R$ 46 milhões concedidos a 25 pequenos frigoríficos localizados na região amazônica, onde 90% do desmatamento vira pasto para pecuária.

Desde 2009, o O estatuto do banco proibia a concessão de empréstimos a frigoríficos Que possui fazendas com infrações socioambientais entre seus fornecedores. Mas a previsão de que os contratos devem ser rescindidos em caso de descumprimento não foi observada nos casos apurados pela Repórter Brasil.

O BNDES comprometeu – pelo menos – cerca de US$ 2,3 bilhões para financiar empresas do setor pecuário diretamente ligadas ao desmatamento no Brasil, segundo dados compilados pela Alliance for Forests and Finance. Foto: (Lilo Clarito/Repórter do Brasil)

“Para o financiamento do BNDES, as empresas de carnes só podem obter gado de fornecedores que não estejam na lista de áreas proibidas do Ibama. Além disso, não podem constar na “lista suja” do Ministério do Trabalho, explicou A. Comunicado de imprensa Foi publicado no site do banco em julho de 2009.

No entanto, em 2012, 2016 e 2017, as empresas de carnes Masterboi, São Francisco, Ribeiro Soares, Fortefrigo, Mercúrio (Pará) e Boi Branco (Mato Grosso) – todas financiadas pelo BNDES – abateram pelo menos 11.513 animais de fazendas que Obama havia proibido. 1.479 foram arrecadados em imóveis listados na Lista de Trabalho Forçado Sujo do Brasil. Um total de 25.158 cabeças de gado vieram de áreas que sequer possuem licença ecológica para operar – outra prática proibida pelo decreto. 1854/2009.

Foram constatadas irregularidades pelo Ministério Público Federal (MPF) em auditorias de licitações corporativas, tanto em suas próprias investigações (no caso de Boi Branco) quanto em Como resultado de acordos de modificação de comportamento (chamados TACs de carne) que verificam a conformidade socioambiental em suas operações. Em todos os casos, o abate foi declarado ilegal após o BNDES firmar contratos com empresas que, de acordo com a Resolução 1.854/2009, devem fornecer dados de que não são provenientes de produtores ilegais. As informações falsas devem ser punidas “com a rescisão antecipada do contrato sem prejuízo das penalidades legais aplicáveis”.

No caso do Masterboi, os contratos somaram R$ 10,5 milhões quando foram revelados problemas com fornecedores. Mercúrio e Ribeiro Soares contraíram empréstimos de R$ 4 milhões cada; A Fortefrigo tinha 1 milhão de réis; A São Francisco (Sampaio) contraiu empréstimos no valor de R$ 100.000. O contrato Boi Branco, no valor de R$ 72 mil, foi assinado um mês antes da assinatura da empresa Ação do Ministério Público Federal por abate ilegal em suas fábricas.

BNDES Portão de Transparência Ele esclarece que parte desses empréstimos ainda está em vigor – indicando que a penalidade prevista na Resolução 1.854/2009 não foi aplicada.

Após a publicação da matéria, o BNDES informou em nota que havia “montado um grupo técnico para analisar os casos mencionados” e que, se comprovadas as supostas irregularidades, o banco adotaria “procedimentos contratuais adequados”. Inicialmente, o BNDES não se pronunciou sobre as questões, apesar da insistência da Repórter Brasil. A Masterboi também enviou nota somente após a publicação da matéria, afirmando que estava cumprindo suas obrigações socioambientais e que as infrações apontadas eram problemas pontuais. A mesma justificativa foi dada por Mercúrio, Ribeiro Soares e Carnes Boi Branco. As respostas completas podem ser lidas aqui.

Os dados usados ​​neste relatório foram obtidos por Florestas e Finanças A Aliança, que monitora o apoio de bancos e instituições de crédito a potenciais atividades de desmatamento. O grupo rastreou um total de US$ 2,3 bilhões em empréstimos do BNDES para pecuária que ameaçam o meio ambiente do Brasil.

No início de outubro, uma nova rodada de auditorias emitidas pelo Ministério Público Federal no Pará – abrangendo compras de gado de janeiro de 2018 a junho de 2019 – mostrou que as irregularidades continuam impunes. Das 16 empresas avaliadas, Fortefrigo e São Francisco (Sampaio) ficaram em quarto e quinto lugar em não conformidade, com 18,7% e 15,2% de suas compras com algum problema socioambiental, respectivamente. A JBS – maior produtora mundial de proteína animal – lidera a lista de infrações, com problemas em 32% de seu abate.

Os empréstimos concedidos a frigoríficos com irregularidades foram intermediados por instituições financeiras parceiras do BNDES: Itaú Unibanco, Banco do Brasil e Bradesco. De acordo com a Resolução 1854/2009, nessa modalidade de empréstimo – denominado automático indireto Os corretores devem “solicitar dados” das empresas garantindo que tenham sistemas de monitoramento de fornecedores de gado e sigam os padrões exigidos pelo BNDES. Mas, de acordo com as auditorias e investigações do Ministério Público, esse controle era claramente falho.

Pelo menos um dos muitos empréstimos do BNDES que o Masterboi obteve por meio do Itaú Unibanco permaneceu ativo após o surgimento dos problemas. Ribeiro Soares ainda tem dois contratos assinados por meio do Banco do Brasil, mesmo após a descoberta de infrações. Ambas as instituições disseram que não comentariam casos específicos devido à confidencialidade da empresa, mas listaram seus métodos para verificar a conformidade social e ambiental antes de conceder empréstimos. A explicação completa da empresa pode ser lida aqui.

Por outro lado, o Bradesco garantiu sete empréstimos de recursos do BNDES para Mercúrio e um para São Francisco (Sampio), apesar da alegação de não conformidade ambiental. O Bradesco também intermediou o contrato com o Boi Branco, que deveria vencer em 2018. Em contato, o banco informou que não seria suspenso.

Itaú Unibanco e Bradesco são dois dos três maiores bancos privados do Brasil assinou um acordo Promover o desenvolvimento sustentável na região amazônica. Espera-se que eles sigam as diretrizes para o empréstimo da pecuária”, observa Paulo Barreto, pesquisador do Imazon (Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia).

25 pequenos frigoríficos examinados pela Repórter Brasil foram selecionados para colocar em risco 8 milhões de hectares da floresta amazônica. A conta publicada em Estudo 2017 da Amazonconsidera que seus potenciais fornecedores incluem muitas fazendas localizadas em áreas desmatadas, com contra-indicações já declaradas pelo Ibama ou cujas condições do entorno indicam que a destruição é iminente.

É uma área do tamanho da Áustria e mais que o dobro da área ameaçada pelas atividades da JBS. A empresa é a maior fabricante de carne do planeta, superando a exposição da Amazônia ao desmatamento.

Daí a importância do monitoramento de fornecedores. O gado ilegal é o principal motor do desmatamento na Amazônia. Se não houver controle sobre a origem das matérias-primas, o risco de violações socioambientais é alto, diz o procurador-geral Riccardo Negrini, que trabalha na Barra, onde os primeiros acordos de modificação de comportamento para a indústria de carnes foram assinados em 2009.

Embora o BNDES exija que os frigoríficos tenham sistemas de monitoramento para verificar a origem dos animais abatidos, 10 empresas que receberam um total de R$ 13,2 milhões não assinaram o contrato de carne com o Ministério Público. Segundo o pesquisador da Amazon, esse é um forte indício de que essas empresas não possuem tais sistemas. “Em geral, as empresas que não assinam o acordo não monitoram a pecuária”, observa.

Mesmo as maiores indústrias de carnes do Brasil – JBS, Marfrig e Minerva – desenvolveram seus sistemas somente após a assinatura do acordo. O que justifica essa suspeita, Ministério Público pediu ao Ibama que endureça as fiscalizações 7 em cada 10 frigoríficos obtiveram empréstimos do BNDES, mas não assinaram tais acordos.

“As empresas devem demonstrar um nível básico de compliance e regulamentação para que a instituição financeira se sinta segura ao conceder crédito. Lisandro Inakaki, coordenador da ONG Imaflora afirma: Projeto Boi na Linha .uma ferramenta que proporciona maior transparência na aquisição de gado para que os consumidores possam verificar a origem do que estão comprando.

Mesmo que fosse implantada a cláusula que prevê a rescisão antecipada de contratos com empresas oriundas de áreas ilegais, a maioria dos problemas não seria contemplada pela Resolução 1854/2009. De acordo com uma auditoria do Ministério Público, Masterboi, Mercúrio, São Francisco (Sampaio), Ribeiro Soares e Fortefrigo compraram 5.441 cabeças de gado criados em terras indígenas e 62.845 cabeças de fazendas desmatadas ilegalmente. Mas, segundo o BNDES, esses fornecedores não devem ser excluídos da cadeia de fornecimento, a menos que sejam considerados culpados desses crimes em todos os tribunais.

Os empréstimos do BNDES oferecidos por meio de bancos comerciais, como os analisados ​​neste artigo, também fecham os olhos para possíveis irregularidades de fornecedores indiretos – aqueles que vendem animais para fazendas que os revendem para empresas.

Portanto, as multas de R$ 2 milhões que o Ibama impôs à Mercúrio por comprar 3.767 cabeças de gado de fazendas proibidas não seriam suficientes para o banco punir a empresa, pois os animais entravam na linha de produção por meio de fornecedores indiretos. O fato de os fornecedores indiretos da empresa incluírem proprietários de fazendas O gado criado em terras indígenas em Apyterewa, no Pará, e os agricultores que utilizam trabalho forçado, também foram negligenciados, conforme revelado pela Repórter Brasil em 2020 e 2021.

A Resolução 1.854/2009 estabelece que esse elo da cadeia de suprimentos só deve ser monitorado quando os empréstimos são firmados diretamente com o BNDES ou quando o banco de desenvolvimento se torna um parceiro corporativo, como é o caso da JBS. mesmo em Esta parte da base, no entanto, não brotou do chão.

“As políticas de sustentabilidade não podem ser apenas palavras; o advogado Riccardo Negrini conclui que elas devem ser implementadas de fato, com transparência e prestação de contas à sociedade.

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