Aumentos de preços estão testando as fintechs que revolucionaram os bancos brasileiros

Não houve outro momento que tenha capturado a euforia dos investidores sobre fintech na América Latina como a estreia do Nubank na Bolsa de Nova York.

No primeiro dia de ações da startup brasileira, no final do ano passado, ela saltou brevemente para a posição de instituição financeira mais valiosa do continente, avaliada em quase US$ 50 bilhões.

A abundância não durou muito. Hoje, a empresa de nove anos, que inclui o grupo de tecnologia japonês SoftBank e a Berkshire Hathaway, de Warren Buffett, está sendo negociada cerca de dois terços abaixo de seu pico.

Para ter certeza, o Nubank é apenas uma das muitas vítimas da venda global mais ampla de tecnologia. Mas sua estagnação também reflete as nuvens macroeconômicas que estão lançando uma sombra sobre o florescente setor de fintech do Brasil.

A indústria emergente provou ser um raro ponto brilhante na maior economia da América do Sul nos últimos anos. Marcas domésticas como C6 e Creditas passaram do status de “unicórnio”, o cobiçado rótulo de uma empresa de bilhões de dólares de propriedade privada. Agora, porém, altas taxas de juros, inflação de dois dígitos e uma perspectiva econômica fraca estão testando o setor.

“Há dúvidas sobre a sustentabilidade de algumas fintechs”, diz Bruno Deniz, da consultoria paulista Spiralem. “Sobreviver em um cenário de escassez de capital durante a fase de crescimento é um grande desafio que alguns enfrentarão.”

Em um país onde milhões há muito são mal atendidos por grandes credores, provedores de empréstimos, contas correntes e investimentos baseados em aplicativos sacudiram um oligopólio bancário outrora famoso pela burocracia, empréstimos caros e cobrança de taxas por serviços essenciais.

Mas as taxas de juros historicamente baixas que os ajudaram a prosperar desapareceram. O banco central do Brasil seguiu com uma forte resposta aos aumentos de preços, elevando a taxa básica de juros de 2% para 12,75% em pouco mais de um ano.

A preocupação é que os concorrentes tenham dificuldades para repassar o aumento dos custos financeiros aos consumidores, especialmente aqueles de grupos de baixa renda. “Agora que temos um ambiente de altas taxas de juros, acreditamos que eles serão desafiados a continuar ganhando participação de mercado e competir com os bancos”, diz Cynthia Cohen-Froy, analista de ratings da Standard & Poor’s.

Outra preocupação é que a demografia desfavorecida visada por alguns dos bancos mais novos do Brasil é mais suscetível à erosão da renda, o que pode levar a um ligeiro aumento no “atraso” – quando os mutuários entram em default.

A processadora de pagamentos brasileira Stone oferece um aviso preocupante. Outrora queridinha do Nasdaq, expandiu-se para um crédito para pequenas e médias empresas, mas depois passou por dificuldades e parou de emprestar no ano passado.

Pode haver dois fatores principais para outras empresas de fintech. A primeira é quão bem ela é capitalizada. Aqueles com almofadas de arrecadações de fundos recentes estarão em melhor posição para enfrentar quaisquer tempestades – ou resistir às pressões da lucratividade.

Veja o Neon, por exemplo, que se tornou um rinoceronte este ano com uma injeção de US$ 300 milhões do banco espanhol BBVA. Até agora, esta fintech brasileira não reajustou o crédito, de acordo com o sócio-gerente Jan Segreste. “Em determinadas situações, não queremos comprometer o crescimento, por isso aceitamos trabalhar com margens menores”, afirma.

Outro elemento importante é a forma como as operações de crédito são financiadas. Muitas fintechs latino-americanas contam com a securitização de carteiras de empréstimos e cartões de crédito, ou financiamento de atacado de bancos, o que pode expô-las a flutuações nas taxas de juros e volatilidade do mercado de capitais.

Por outro lado, os depósitos de varejo tendem a ser mais baratos e mais estáveis. O Nubank enaltece esse aspecto de seu balanço patrimonial, juntamente com a pilha de caixa de sua oferta pública inicial. Enquanto as taxas de empréstimos estão em alta, o diretor financeiro Guilherme Lago diz: “Ainda não cobramos nenhuma taxa e, para empréstimos pessoais, ainda classificamos 20 a 25% abaixo da média do setor para alguns grupos de risco”.

De fato, os resultados do primeiro trimestre do Nubank desmentiram o preço pessimista das ações. O prejuízo líquido diminuiu para US$ 45,1 milhões, de US$ 54 milhões no ano anterior, enquanto a receita mais que triplicou no mesmo período do ano anterior, para US$ 877,2 milhões. Apesar dos altos índices de inadimplência, a empresa disse que estavam abaixo dos níveis pré-pandemia.

Mesmo que a América Latina permaneça relativamente impenetrável aos serviços financeiros, a concorrência no Brasil está esquentando. As televisões e os pontos de ônibus estão cheios de anúncios de empresas de tecnologia financeira e bancos da velha escola que agora estão acumulando recursos na digitalização. “Pode haver uma fusão”, diz Lago, do Nubank. “Talvez algumas fintechs tenham que sair do mercado e parar de operar em determinados setores.”

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